Os atrasos nos serviços de urgência e os problemas estruturais no setor da saúde em Portugal têm sido amplamente noticiados, evidenciando desafios preocupantes em várias regiões do país. O caso do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (HFF), também conhecido como Hospital Amadora-Sintra, ilustra bem essas dificuldades. Segundo o Observador, em 28 de dezembro de 2024, “os doentes urgentes (pulseira amarela) estão a esperar em média 10 horas e 19 minutos no Hospital Amadora-Sintra, o tempo de espera mais demorado entre os principais hospitais do país”. Este dado reflete uma falha grave na capacidade de resposta do hospital às necessidades da população.
Um dos principais problemas do HFF é o facto de este servir simultaneamente os concelhos da Amadora e de Sintra, abrangendo uma população de 549 mil habitantes. Sintra, o concelho mais populoso após Lisboa, apresenta características e necessidades que sobrecarregam o sistema. Esta realidade contrasta fortemente com outros concelhos de dimensão populacional semelhante, como Cascais, que conta com cinco hospitais privados e um hospital em regime de parceria público-privada (PPP), enquanto a Amadora dispõe apenas de um hospital público e dois privados.
A sobrecarga enfrentada pelo HFF não pode ser atribuída a um aumento populacional inesperado, mas sim a problemas de gestão pública e à falta de autonomia administrativa entre os dois territórios. Assim, a divisão entre Amadora e Sintra, com a criação de unidades de saúde distintas, surge como uma solução indispensável para a reorganização dos recursos.
O modelo de Parcerias Público-Privadas (PPP) tem demonstrado ser uma alternativa viável e eficiente para a gestão hospitalar, conforme evidenciado em experiências anteriores em Portugal. Segundo o Tribunal de Contas, em relatório de 2021, os hospitais geridos em regime PPP, como os de Cascais, Braga, Vila Franca de Xira e Loures, não só estiveram plenamente integrados no SNS, como também geraram poupanças significativas para o Estado, além de melhorarem a eficiência dos serviços prestados.
O Hospital de Braga, gerido em regime de PPP até 2019, destaca-se como um exemplo de boa gestão e eficiência. Segundo o relatório da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), publicado em 2016, o hospital apresentou consistentemente altos índices de eficiência, eficácia e qualidade clínica, comparando favoravelmente com outras unidades hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Em termos de eficiência, o Hospital de Braga obteve uma taxa de resolutividade de internamento superior a 90% em todos os anos avaliados, destacando-se entre os hospitais do mesmo grupo. Além disso, o cumprimento dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG) para cirurgias foi globalmente superior à média nacional, reforçando a capacidade do hospital em responder de forma célere às necessidades da população.
O modelo de gestão PPP no Hospital de Braga permitiu uma melhor alocação de recursos, redução de custos operacionais e melhoria dos indicadores de desempenho. Essa experiência demonstra que, quando bem implementado, o regime PPP pode não apenas aliviar a carga sobre o sistema público, mas também garantir serviços de alta qualidade.
O modelo PPP permite a partilha de riscos financeiros entre o setor público e o privado, assegurando maior eficiência operacional, melhor alocação de recursos e neutralidade de custos para os utentes. Em Portugal, o modelo de PPP hospitalar é caracterizado pela divisão de responsabilidades em duas vertentes principais: a gestão das infraestruturas (hard facilities) e a prestação de serviços clínicos e administrativos (soft facilities). Essa abordagem integrada promove maior especialização e eficiência operacional.
O Decreto-Lei n.º 84/2022, que regula a descentralização de competências, abre uma nova janela de oportunidade para a Câmara Municipal da Amadora (CMA) assumir um papel mais ativo na gestão da saúde local.
A descentralização pode permitir que o município participe ativamente na criação de novas unidades de saúde, fomentando a competitividade e o investimento no setor privado. Para além disso, o reforço das competências autárquicas, aliado a um modelo de gestão PPP, poderá garantir uma reorganização mais eficaz dos recursos existentes e promover um atendimento mais célere e humanizado.
A situação vivida no Hospital Amadora-Sintra requer soluções estruturais e inovadoras. A divisão administrativa entre Amadora e Sintra, a implementação de uma gestão em regime PPP e a descentralização de competências para a CMA são passos essenciais para garantir um sistema de saúde mais eficiente e acessível.
Além disso, é fundamental que o Estado, as autarquias e os parceiros privados colaborem na criação de uma rede de saúde integrada, que priorize tanto a eficiência operacional quanto o bem-estar da população. Apenas assim será possível transformar o cenário atual e oferecer aos residentes do concelho da Amadora os cuidados de saúde que merecem.